terça-feira, 16 de outubro de 2012

O sufoco


Hoje quase que morri.

Coisa simples. Cozinhei bulgur e à segunda ou terceira garfada, percebi que a coisa se ia engarrafando lá dentro: ali, bem no meio do peito. Ao nível do plexo solar.

A aflição foi alguma, confesso.  Tentar relaxar, abrir o peito: nada.

Beber copo de água... ui. Pior.

Já de porta aberta, lá tentei um vómito que, não vindo, desbloqueou algo.

Ufa.

Não morri.

Maldito plexo solar. Quase me ias matando, sacana!

Dizem que o plexo solar, terceiro chakra, é a porta de entrada e saída das emoções. Devo andar com os sentimentos meio engasgadas.

... Recorda-me uma entrevista em que perguntava-se a um autor literário que morte preferiria ter caso lhe fosse dado escolher. “Queria morrer de pneumonia”, responde o autor, acrescentando “não há nada mais belo que morrer pelos pulmões”.

Pois meu caro autor, há pois: morrer engasgado pelo plexo solar. A parte do bulgur é que pode não constar dos anais.

Mas esta pequena incursão forçada à minha geografia interna veio recordar-me o quão frágil é tudo isto. Uma coisa tão absurda quanto uma garfada pode bastar para pôr fim a uma cosmologia de sonhos nascentes. Como é que não hei de ser um relativista convicto?

As coisas começam e acabam assim, do nada; é em parte o que lhes faz a beleza.

Querer anular o risco, anula também toda a magia que nasce dos acasos. 

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